Fortaleza: visitar é diferente de morar?

 

 

 

Sempre que converso com turistas que estão de passagem, ou que vem à cidade de vez em quando nas férias, percebo que amam Fortaleza. Tem pouquíssimas coisas pra falar de ruim, e geralmente são sempre as mesmas coisas que se fala de toda grande cidade: a violência é preocupante, os assaltos, a sujeira na orla, o trânsito, o atendimento ruim nos estabelecimentos etc.

 

E quase sempre tem centenas de elogios à nossa gente: generosa, hospitaleira, divertida, bem humorada, sabe receber, sabe deixar à vontade…

 

Mas quando converso com pessoas que vieram morar aqui e já estão há mais de cinco anos, por exemplo, só pra ter uma referência de tempo, grande parte delas tem muito a reclamar.

 

Nem tanto do clima quente, do sol impiedoso ou da insegurança, mas das diferenças culturais! Aquele povo alegre, hospitaleiro, de repente se torna preguiçoso, burro e cheio de defeitinhos imperdoáveis.

 

Sim, muita gente acaba desenvolvendo uma antipatia enorme pelo povo da cidade, e generaliza, e faz julgamentos injustos.

 

Uma queixa comum é a de o fortalezense ser folgado e preguiçoso. Muito comum em quem vem de São Paulo ou Brasília, pelo que tenho percebido. Cidade em que o ritmo de trabalho é bem diferente do daqui. Cidades em que um funcionário que se recusa a ficar várias horas depois do expediente (quase sempre sem ganhar hora extra) perde o emprego no dia seguinte, porque a concorrência é desumana.

 

Aqui, quase não há funcionários assim. ou há poucos. quando “dá a hora”, a pessoa “vaza”, “capa o gato”, “pega o beco” e vai embora mesmo. um direito dela,ué. se não vai receber, também não vai ficar ali…

 

Nas escadas rolantes, a gente ainda não desenvolveu aquele hábito que só no meu segundo dia de visita a São Paulo eu notei e passei a fazer: se vai ficar parado na escada rolante, esperando ela subir, fica à direita e deixa a esquerda livre pra maioria passar correndo, subindo a escada alucinadamente. Isso ainda não vi aqui. Ainda temos tempo pra esperar a escada nos levar. E não, isso não é preguiça. Nosso ritmo de vida e de trabalho nos permite isso.

 

Outra queixa muito comum é de que fortalezenses são enrolados, burros, não sabem negociar nem discutir. Pois bem: a alma sertaneja, que habita ainda em muitos fortalezenses nascidos no interior, ou com raízes familiares lá, é acostumada a entrar pedindo licença, falando baixo, de cabeça baixa e olhar humilde. Isso é bom ou é ruim? Não sei. às vezes pode ser bom, outras vezes pode ser ruim, mas é assim que é: o homem simples do sertão não chega gritando, não se acha dono do mundo, não afirma saber de tudo, nem fala de queixo erguido pra ninguém, a não ser que a pessoa tente deliberadamente o subjugar. Aí sim, ele pode reagir como seu temperamento mandar. Mas os homens e mulheres do sertão são calmos, tranquilos, como o ritmo de vida do interior, como o ritmo da natureza, que rege toda a vida que existe por lá.

 

Fortalezense assim, com raiz no sertão, não gosta de dar ordens explícitas, no imperativo. Pede. Aconselha. Sugere. Não grita se não for realmente necessário. Em São Paulo e no Rio, por exemplo, é comum desconhecidos na rua darem ordens uns aos outros, como “ei, você, apanha esse papel de bala aí que você jogou no chão. Joga na lixeira”. O fortalezense que imigrantes chamam de “lesado” e “enrolado”, quando muito, dá toques leves no ombro da pessoa e diz: “moço, senhor, senhora, moça, o que seja… caiu esse papel aqui, ó”, e entrega. Pessoalmente, acho que essa forma de se expressar carrega muita classe.

 

Lógico que nem todos os fortalezenses são assim, mas diante de tanta reclamação às vezes infundada, é preciso esclarecer. Muitas coisas não são erradas, nem piores ou inferiores: são apenas diferentes. Diferentes formas de ver e agir no mundo. Diferenças culturais.

 

Ah, outra crítica é a de que não sabemos dar orientações. Bom, podemos não saber expressar de forma resumida ou prática um endereço ou como chegar até ele, mas ao menos sabemos do que está sendo falado. Tem cidade tão grande por aí que a pessoa mora ou trabalha num bairro há anos e não sabe que existe uma farmácia ali no próximo quarteirão.

 

Então você que veio de outro lugar e está começando a “criar abuso” do nosso jeitinho, pondere antes de ser injusto (a): “será a diferença cultural”? “Estou sendo preconceituoso(a)”?

 

Fonte - http://moraremfortaleza.com.br/

 

 

 

 



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