Os dinossauros do rock soltam seu rugido

 

 

 

 

Com quase 20 anos de estrada, Renegados lança hoje seu primeiro disco de estúdio, às 18h30, na Cultura.

 

O rock de Fortaleza dos anos 1990 para cá já pendeu para as bandas de metal, já teve sua onda punk-hardcore, alternativo, pop, indie, regional. Muito mudou. Com mais ou menos destaque, as bandas circulam na cidade ao longo dos anos e se sucedem, reorganizando em novas formações e propostas. Nos últimos 19 anos do rock cearense, no entanto, pelo menos uma coisa não mudou: a música da banda Renegados.

 

Brotada entre aguapés da lagoa da Messejana e os bares do bairro, a banda é a própria materialização de nosso rock, com um repertório autoral carregado de crítica social e política e um som marcado pelo influência de clássicos, com toques regionais. Hoje, eles lançam disco novo em show gratuito na Livraria Cultura, às 18h30.

 

Batizado de "Além dos Rótulos, o disco traz 15 faixas autorais que mantém a personalidade roqueira da banda, pautado pelo blues e o rock dos anos 1960 e 1970, com referências da música nordestina e outras invenções do "Renegado" Marcelo Pinheiro Rocha (guitarra e voz), de seu irmão Ricardo Pinheiro Rocha (bateria e percussões) e de Romualdo Filho (baixo e teclado).

 

Lançado pelo selo Radiadora Cultural (com coprodução de Alan Mendonça), o disco é o primeiro gravado em estúdio, com a maior parte dos registros feitos entre 2010 e 2011 e apenas as bases de algumas músicas retirada de shows de 2007, no Anexo do Theatro José de Alencar, e de 2009, no Centro Cultural do Banco do Nordeste de Fortaleza (CCBNB). As faixas foram trabalhadas - gravadas, mixadas e masterizadas - no Renegados Studio, com o próprio Marcelo à frente de todo o processo. É dele também os créditos pela direção musical, produção e arranjos do CD.

 

O disco é aguardado pelo público já há um bom tempo, pois, apesar da longa estrada, a discografia da Renegados é ainda modesta, incluindo, antes deste, apenas dois discos gravados ao vivo: "Sem Fronteira" (2001), captado em shows no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC); e "A Essência" (2003), em shows no CDMAC, CCBNB e em turnê pelo interior do Ceará.

 

O trabalho em estúdio é marcado por uma riqueza instrumental, mostrando a maturidade musical do grupo e apontando novas sonoridades agregadas ao bom e velho rock´n´roll. Em trecho publicado no encarte, Marcelo Pinheiro traduz com clareza o espírito destes quase 20 anos de estrada que deságuam agora no disco: "Rock and roll não é apenas um gênero musical, mas principalmente um estilo de vida em favor da libertação das mentes aprisionadas em antigos valores...".

 

Canções

 

Abrindo com o rock "Não Cale", é já na segunda faixa "Sertão da Alma", que o grupo traduz esta filosofia. A música é uma das faixas gravadas ao vivo pelo grupo em show de 2007 CCBNB, com algumas intervenções de estúdio. Parceria com Ezio Pinheiro e Marcelo (Renegado) Pinheiro, a música estampa a influência da música nordestina no rock do grupo, "Partindo pro novo / pro sertão da alma", como entoa os versos da canção, fazendo menção à um som ancestral, que perpassa a música indígena e o maracatu. Guitarras distorcidas são temperadas ao ritmo das alfaias, e dão mostras do trabalho caprichado de estúdio com burilação de efeitos percussivos, vocais, além do bandolim e clarineta de Ulisses Germano.

 

A quinta faixa, "Continuar", mais referências ao Nordeste. Narrando cenas do cotidiano de um trabalhador, o violão de aço e guitarras distorcidas compõem com um canto forte que lembram, em certos momentos, o canto de aboio e se aproxima no refrão, como em menção poética, ao tradicional coco "Usina", de Chico Antônio do Ganzá. Mais direta e clara são as referências nas faixas "Dona", outra parceria com Ezio, que traz o toque do Maracatu cearense e em "Martelo", uma mescla de balada rock com martelo alagoano.

 

O blues-rock, identidade central do grupo, vem estampado de em "Ataque Blues", carregado de crítica política e o tom profético, marcam de longa data da poesia de Marcelo. Na mesma linha segue a quarta faixa, "Sem Fronteira", mais puxada para o rock, a faixa prova a coerência e a qualidade criativa do grupo ao longo da trajetória: é um trabalho do primeiro disco que ganha regravação com nova roupagem. Além dela, "Mentes Invisíveis" também é uma regravação do mesmo álbum.

 

O tom crítico soa também na balada a Bob Dylan "Iraque", em que Marcelo dispara contra o ex-presidente americano George Bush, o ex-primeiro-ministro do Reino Unido e a política externa de trocar "sangue por petróleo".

 

É inspiradora a forma como a banda mantém-se fiel a influência rock-blues ainda quando flerta com outros estilos, apontando novas possibilidades sem perder a sua identidade. Em "Meiga Tempestade", única faixa instrumental do disco, eles fazem um blues com sonoridade árabe, caminhando ainda para a música flamenca e o rock progressivo. A mesma riqueza instrumental segue na penúltima faixa do disco "Asas do Vento", gravada ao vivo em show no anexo do Theatro José de Alencar, em 2007, que tem participação de quatro músicos convidados: Priscila Guimarães, nas vocalizações, Marcus Rocha na flauta, Jorge Santa Rosa na viola e Rodrigo Oliveira nas percussões.

 

"Além dos Rótulos" é um disco para se ouvir várias vezes e mostra a força criativa de uma banda que segue se recriando, sem perder sua marca, que faz rock sem preconceitos, aberto a novas referências, sem cair em fórmulas gastas, nem promover um "samba do crioulo doido". É rock de qualidade e identidade.

 

Disco

 

"Além dos rótulos"

Renegados Independente 2012,

15 faixas

R$ 15

 

ENTREVISTA - Marcelo Pinheiro Músico

 

"Não temos pretensão de fazer a coisa purista"

 

Por que vocês ficaram tanto tempo sem lançar disco?

 

Ao invés de pegar uma grana, pagar estúdio e não ficar como eu queria, preferi demorar mais um tempo e ir comprando equipamento para eu mesmo gravar o CD. A tecnologia, hoje, propicia aquela história do "faça você mesmo", só que com qualidade. Se você trabalhar com coerência e critério, vai conseguir um resultado muito interessante. Aquela história de ser só músico já era. Tem que ser produtor, ser multimídia, fazer várias coisas ao mesmo tempo.

 

Como foi o processo de gravação?

 

Gravamos em estúdio entre 2010 e 2011. O CD tem ainda duas faixas que foram gravadas em 2007, outras em 2009. Eu quis aproveitar algumas gravações ao vivo que estavam legais e acrescentei vários instrumentos no estúdio. Tem música com influencia árabe, indiana e renascentista, tem uma que é uma mistura de martelo alagoano. A gente não tem pretensão de fazer coisa purista. Pega algumas influências e misturam com linguagens universais do rock e do blues.

 

 

 

Fonte - DN



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